Lendo o Avelar, como fa?o diariamente, topei com este seu coment?rio sobre a nova medida e, ainda, com a declara??o de Giannotti. Como o assunto me interessa, tanto que postei a aprova??o no dia, quero fazer mais alguns adendos:
1) De fato, Avelar tem raz?o ao dizer qu?o il?gica ? a posi??o que pressup?e que n?o se deve mudar nada at? que se possa mudar tudo. “Mudar tudo” demanda tempo – leia-se gera??es -, o que privaria sem real motivo os atuais discentes de ao menos tomarem contato com algo que se chama filosofia. Pr?ticas educacionais n?o podem esperar o fim da hist?ria ou a sociedade sem classes, ainda que se configurem como ajustes m?nimos (sendo altamente discut?vel a quest?o sobre qu?o m?nima ? re-inclus?o das disciplinas acima citadas). A acreditar em Arist?teles – e no livro alfa de sua Metaf?sica -, o to thaum?zein, o espanto, ainda ? o primeiro motor da atividade filos?fica e se imp?e frente a toda discuss?o pol?tica (esta sim impregnada, por vezes, da vacuidade que imputam ? filosofia). Assim, simplesmente n?o encontro sentido na pergunta que Giannotti se faz acerca de como ensinar filosofia para quem n?o aprendeu a raciocinar. N?o seria esta uma das nobres tarefas da filosofia? Despertar o amor pelas di?iresis e synagog?s (Fedro, 266B)? Ou a filosofia contempor?nea, isto ?, feita atualmente n?o deve mais ser semelhante a Eros e, portanto, desejante? Deveria ser reduzida a um “fazer discursos bem articulados” que talvez falem do Amor (ou de quaisquer outros temas) sem estar ele mesmo enamorado. O germe inicial da reflex?o ? aquele mesmo da filosofia. Ent?o, como pedir uma multitude de pressupostos?
2) Mas lendo a declara??o do professor Giannotti n?o posso deixar de concordar com algumas coisas. Diz o professor:
A meu ver, h? coisas mais importantes, que s?o prioridades, do que ensinar filosofia. Em particular ensinar portugu?s, como todos sabem, al?m de f?sica, biologia, matem?tica, hist?ria, geografia… Isto ?, se situar no plano da linguagem, da ci?ncia e da temporalidade. Coisa que a maioria dos professores de ensino m?dio n?o ? capaz de fazer. N?s vamos gastar tempo e esfor?o em coisas subsidiadas ao inv?s de focar no fundamental.
Desbastado o elemento apontado no t?pico acima, que n?o admite um pequeno ganho se n?o for acompanhado do resultado total, resta ainda algo a ser focalizado no que diz o professor (e n?o creio que isto seja sinal de um ju?zo sobre a indignidade ou incapacidade dos jovens para a filosofia, como aponta Avelar).
A quest?o ? que n?o temos bons professores de portugu?s, matem?tica ou f?sica. H? sim muitos bons professores de gram?tica, c?lculo e f?rmulas. Com isso quero dizer que n?o se ensina nos col?gios o pensamento sobre a linguagem ou a literatura, a reflex?o sobre os n?meros e suas rela??es nem tampouco a entender a physis. H? poucos dias fiquei surpreso com a rea??o de um colega, professor de matem?tica que ria largamente da investiga??o de Frege tendo em vista responder a pergunta “o que s?o n?meros?”. O colega soltou uma defini??o rid?cula (desmontada por Frege com muito senso de humor, diga-se de passagem, em um par?grafo de seu Fundamentos da Aritm?tica) e ca?oou da inutilidade de tal esfor?o.
Dessa forma, a filosofia ensinada por professores de filosofia med?ocres, estaria reduzida a um mero contar de sua hist?ria ou, ainda, a um procedimento mec?nico de associa??es de no??es jamais verdadeiramente entendidas. O que, visivelmente, nos faria recair na concep??o de filosofia como simulacro de qualquer coisa s?ria.
Diz ainda o professor:
As pessoas v?o come?ar a estudar os pr?-socr?ticos, falando de Tales, depois Parm?nides, Plat?o, Arist?teles e se chegar aos est?icos vai ser muito. Teremos um curso de filosofia que vai se resolver numa “decoreba” danada.
Como j? apontei aqui, mesmo o curr?culo “oficial” ? um piada. Vai de Tales a Wittgenstein em um ano. Isto serve bem ao prop?sito de escamotear a falta de n?vel dos professores, bem como ?quele de fazer da filosofia um ap?ndice de (falsa) erudi??o e n?o um espa?o de interven??o reflexiva em todos os dom?nios das ci?ncias (e portanto nas outras disciplinas) assim como na vida do pr?prio aluno. ? esse ?lan que cega profissionais de educa??o que falam tanto de “interdisciplinariedade” sem ver que ? a filosofia, como scientia rerum per causam ou como verdadeira epist?me ? a base para a concreta rela??o entre as disciplinas e, destas, com a vida.
Voltaremos a isso.
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