De tempos pra cá, pode-se notar um crescimento no interesse (que catapulta Dan Brown e seus asseclas) por livros que tentam mesclar ficção e realidade em assuntos como filosofia, religião, teologia, história medieval etc. Não há como não lembrar também de outro que, embora seja Prêmio Nobel (ahn, bons tempos em que só grandes sujeitos eram laureados…), não faz lá coisas muito diferentes: José Saramago e seu Caim. Novamente, nada conta a ficção. O problema está na meta básis eis allo génos, ou passagem para outro gênero, como diz Aristóteles. De fato, consumidores deste tipo de livro têm uma curiosidade que se pode dizer sincera sobre tais assuntos. Contudo, fazem uma passagem de nível absurdamente nociva e, por que não dizer, irritante.
Jamais, em tempo algum, Dan Brown seria citado entre scholars como bibliografia para estudos medievais ou sobre história da Igreja. Saramago nunca seria lembrado como biblista pelos devaneios que comete em seu Caim ou, ainda, em seu O Evangelho segundo Jesus Cristo, por exegetas que se dedicam durante uma vida a estudar tais temas a sério; ainda, Quando Nietzsche chorou não deve ser bibliografia obrigatória para se entender o pensador alemão. O que ocorre é a materialização atual da intuição platônica de que poetas (e aqui, romancistas) iludem e conduzem ao erro sob o verniz da bela forma, do entretenimento ou da falsa erudição. É cada vez mais frequente nas discussões, repudiar estudiosos em favor de diletantes vomitadores de best-sellers. Agora são estes as autoridades últimas.
E voltamos a um tipo de incômodo que sinto há anos. Ninguém aceitaria morar numa casa construída por mim caso eu apresentasse como credenciais, anos e anos brincando de Lego quando pequeno. Ou ainda, alguém aceitaria que eu abrisse sua cabeça em caso de um tumor, já que coleciono leituras sobre as maravilhas do cérebro?
* Apenas para explicitação, que se note que o argumento anselmiano é bastante diferente daquele que Descartes apresenta em suas Meditações, que ganha o predicado “ontológico”.
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Mesmo em termos de ficção, Dan Brown é muitíssimo inferior ao Umberto Eco, cujo "Pêndulo de Foucault" comecei a reler. Talvez aí seja o mesmo caso: um especialista com uma obra melhor, mais completa e interessante do que a de um aventureiro. Claro que há os "falsos doutores" também, que possuem credenciais universitárias mas pouca competência real.
"...por livros que tentam mesclar ficção e realidade em assuntos como filosofia, religião, teologia, história medieval etc..."
compartilho de todas as opiniões do artigo e acredito, também, que esses livros fazem sucesso justamente por tratarem desses assuntos que "o povão" gosta mas não sabe bem por onde ler. No entanto, uma opinião que trata mais da questão literária do que da heresia dos livros é que não são obras que tentam mesclar ficção e realidade, essas eu diria que ainda estão no realismo fantástico e são muito boas, geralmente. Acredito que seja um novo gênero canastrão de literatura surgindo, uma ficção que os leitores confundem com realidade.
Grande Beijos Gab, sempre um prazer passear por aqui.