“A obra do amor que consiste em recordar uma pessoa falecida é uma obra do amor mais desinteressado.
Se quisermos garantir que o amor é completamente desinteressado, podemos então afastar toda a possibilidade de retribuição. Mas é isto justamente o que está excluído na relação com uma pessoa falecida. Se então o amor permanece, é que ele é verdadeiramente desprendido.
A retribuição em relação ao amor pode ser muito variada. Podemos tirar uma vantagem e um ganho; e este é afinal de contas sempre o que há de mais comum, é típico da ‘divisa pagã’ de ‘amarmos aquele que nos retribui’. Neste sentido, a retribuição é algo de diferente do próprio amor, é algo de heterogêneo. Mas há também uma retribuição para o amor, que é da mesma natureza do amor: o amor correspondido. E tanta bondade há por certo na maioria dos homens que eles normalmente consideram de suprema importância essa retribuição, a da gratidão, do discernimento, da devoção, enfim, a correspondência do amor, mesmo se por outro lado eles se recusam a conceder que se trata de uma contrapartida, e por isso crêem que não se pode chamar o amor de interessado na medida eem que persegue tal correspondência. Aquele, porém, que está morto não retribui em sentido algum
[…] Se então queres examinar-te e ver se amas de modo desinteressado, atenta para o modoo como te relacionas para com um morto.
[…] E então, no passar dos anos ter de recordar um morto, ai, enquanto ele nada faz para nos ajudar; ou melhor, se ele faz algo, ou simplesmente nada fazendo, tudo faz para mostrar-nos quão indiferente para ele é tudo isso! No entanto, os múltiplos desafios da vida nos acenam; os vivos nos acenam e dizem: ‘vem juntar-te a nós, nós te daremos nosso afeto’. O falecido, porém, não pode acenar para nós, mesmo se tal fosse o seu desejo; ele não pode mexer um dedo; ele jaz e se reduz a pó – como é fácil para as potências da vida e do instante sobrepujar alguém tão impotente! Oh, não há ninguém tão desvalido quanto um morto, enquanto que ao mesmo tempo em seu desamparo ele não exerce absoluutamente a mínima pressão! E por isso nenhum amor é livre como a obra de amor que recorda uma pessoa falecida – pois recordá-la é outra coisa do que não poder esquecê-la no início.”
excertos de KIERKEGAARD, S. “A obra de amor que consiste em recordar uma pessoa falecida”, In: KIERKEGAARD, S. As obras do amor.
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