O homem foi concebido para duvidar de si mesmo,
mas não duvidar da verdade, e isso foi exatamente invertido.
G. K. Chesterton, Ortodoxia
Há pouco vi uma notícia no site do The Guardian, que a British Humanist Association está promovendo a colocada de propagandas com conteúdo ateísta em ônibus da Inglaterra, como o da foto ao lado. O ateísta-pop (pois é, não há somente padre-pop) Richard Dawkins contribuiu inclusive financeiramente para a campanha. Bem, o dinheiro é deles e eles fazem o que quiserem ou seja, é uma publicidade bizarra, mas legítima. Entretanto, o que salta aos olhos são algumas outras bizarrices embutidas aí que a velocidade com que o ônibus passa não pode obliterar a paciência da reflexão.
1. Bons tempos eram aqueles em que se criticavam as pessoas de fé pelo fato de que suas crenças não passavam de projeções, numa alteridade (Deus), dos desejos mais humanos, o que seria causa de um feliz torpor alienante (não é, Feuerbach?). Mas agora, vejam vocês, como diz o anúncio, a provável não existência de Deus deve fazer com que você pare é de se preocupar e comece a aproveitar a vida. Deriva-se disso que a crença em Deus leva diretamente à preocupação, ao "stress" (essa palavra mágica dos nossos dias) e ao embotamento da vida. Crer em Deus, além de uma deficiência estatística, não tem mais nada a ver com aquela idéia tão fundamental do Evangelho, que estabelece de uma ver por todas a relação íntima entre a Verdade e a liberdade (Jo 8,32), mas é causa de uma preocupação tenebrosa que é inimiga do bom proveito da vida.
2. A "deficiência estatística" a que me referi é expressa pela improbabilidade da existência de Deus, veiculada no anúncio. Mas ela esconde uma tese mais nefasta, a saber, de que a racionalidade encontra sua expressão (senão máxima, a mais pujante) na estatística, no cálculo e na ciência. Não vou explicar porque è óbvia a passagem indevida. Leia Heidegger, Taylor, Camus, Adorno, Horkheimer, Chesterton, entre muitos outros. O que torna o quadro mais tenebroso é quão cristalizada essa equação tola está se tornando, sendo arrolada até como base de argumento ateísta que se pretende "sério" (não é, Dawkins?)
3. Mas o pensamento tem mesmo suas surpresas. Não custa nada abandonar Monsieur Descartes por um instante e pensar dialeticamente. Qual é o gênero de preocupações do qual os ateístas querem nos livrar? A imaginar pelo "enjoy your life", são aquelas referentes a palavrinhas ou sentenças inconvenientes como "morte", "responsabilidade", "sentido da vida", "ética", "imortalidade". Questões que mesmo Kant, que desferiu duros golpes contra a possibilidade de conhecimento racional (sério, desta vez) acerca dessas questões, não deixou de dizer que:
Problemas como estes: se o mundo tem um princípio e um limite da sua extensão no espaço; se algures e talvez no meu próprio eu pensante há uma unidade indissolúvel e indivisível ou apenas o divisível e o transitório; se sou livre nos meus atos ou, como outros seres, sou conduzido pelo fio da natureza e do destino; se, finalmente, há uma suprema causa do mundo ou se as coisas da natureza e a sua ordem constituem o último objeto onde devemos deter todas as nossas considerações; problemas estes, pela solução dos quais, de bom grado, o matemático daria toda a sua ciência, porque esta não pode satisfazer os mais altos e importantes anelos da humanidade.
KANT, I. CRP, B 492.
E eis que o que surge, diante dessa apatia cientificista deficiente, é o mais puro torpor alienante criado por uma idéia infantil do "aproveitar a vida" e que faz com que os ateístas que pretendem hospedar a Razão e o esclarecimento emergem como uma legião de pseudo-intelectuais marketeiros que estão muito pouco dispostos a debater e muito mais dispostos a propagandear.O que nos leva ao próximo ponto.
4. Serei bem breve: a instituição que propaga tal publicidade se denomina "humanista". Ora, ao querer livrar o homem destas "preocupações", será possível ser humanista? Sem dar espaço epistemológico às questões mais primordiais ao homem?
E então
Oi Gabriel, sou o Leandro da Faculdade de S?o Bento, lembra-se? Eu estava no semin?rio sobre o iluminismo retirado da “Dial?tica do Esclarecimento”.
Queria dizer algumas coisas:
1. Obrigado pelas aulas que esteve conosco;
2. ? poss?vel aproveitar a vida e acreditar em Deus (sou protestante), e afirmo isso baseado na relatividade do objeto a ser aproveitado. O que ? que far?amos de melhor se Deus n?o existisse? N?o ? isso subjetivo?
3. Voc? disse em aula uma “blasf?mia” do Nietzsche, a saber, que ele afirma ser o cristianismo a verdade. Onde est? isso? Eu gostaria muito de saber.
4. Estou por aqui. Tenho lido os posts e gostado muito.
5. Abra?os!
Car?ssimo Leandro.
1. Foi um prazer para mim tamb?m. Espero que possa voltar.
2. Pois ?. Espero ter mostrado no post que a aus?ncia de preocupa??o com os problemas fundamentais n?o pode ser causa de “alegria” maior do que a s?ria considera??o de tais quest?es.
3. Veja o pr?ximo post.
4. Que boa surpresa. Continue aparecendo e comentando.
5. Abra?os a ti tamb?m.
Pingback: Alguns fragmentos extempor?neos | Inter-Esse
Pingback: A ci?ncia torna a cren?a em Deus obsoleta? | Inter-Esse
Pingback: Deus n?o ? cat?lico??? | Inter-Esse
Pingback: Obama sobre religi?o e pol?tica ou Sobre Ser e Parecer | Inter-Esse
Pingback: A fal?cia do vern?culo | Inter-Esse
Pingback: Sobre Moral e Religião – alguns apontamentos | Inter-Esse
Vc querem inserir simbolos de paganismo(cruz, imagens, retratos de um caucasiano barbudo) em oragaos e locais´publicos, no entanto, quando é para defender o ateismo ai o mundo acaba, e niguem respeita a crença. VAmos fazer um acordo, saiem os anuncios do ateismo e sai tambem o simbologia cristã/romana/germanica/judaico/egpicias/filhos de jupter, dos orgaos publicos. DAI TODO MUNDO FICA FELIZ.
A julgar pelo nível das respostas que (parecem) atéias, eu vejo que o debate vai ser difícil
Edy.
Vou ignorar sua péssima escrita e vou levar a sério seu comentário tão fraco quanto sua expressão escrita. Em breve respondo num post.
G.
Caro Ramon
Tenha mais respeito com o português, você escreve muito mal!
Poderia esclarecer melhor seu comentário para iniciarmos uma conversa? Se levarmos ao pé da letra seu comentário (sem ironias), uma cidade como São Paulo deveria mudar de nome? Ou ainda, Ouro Preto deveria sumir praticamente do mapa?
Sua tese é não só absurdo como absolutamente ridícula e impraticável.
Se você é ateu, qual o problema com qualquer imagem de origem religiosa, ela não passa de uma mera pintura, um objeto de decoração, não é mesmo? Então, o problema é estético e não um conflito de visões de mundo. Já que não há significado religioso, a única cosa que sobra é você achar feio imagens como uma “Crucificação”, “Sagrada Família”, “Pietá” etc, não?
Att
Francisco
Calma aí! Não sou eu que sou ateu! hahaha É o Edy! E mesmo que eu fosse ateu, teria respeito pelas imagens religiosas, pela fé das pessoas e, como você, Francisco Razzo disse, pela arte criada com tema religioso, que deve ser uma das mais abundantes do engenho humano.
Eu apenas comentei um pouco mais acima o quanto é rasa a mentalidade ateísta que o Edy revelou.
Caro Ramon, mil desculpas. O comentário era realmente para o Edy
Abraços
“Aqui havia um povo decente e ateu; / os seus únicos monumentos são as estradas de asfalto / e bolas de golfe perdidas”.
T.S. Eliot