O que é a Filosofia? Algumas respostas célebres e meu pequeno comentário

Em um post de 2010, o prof. Bill Vallicella, autor do melhor blog sobre Filosofia da Internet, publicou uma pequena compilação de considerações em torno da questão “O que é a Filosofia?”, dadas por alguns filósofos. Da lista, a que mais se aproxima do que eu mesmo penso é, não sem certa surpresa, a de Popper (com destaques para as citações de T. Nagel e Wittgenstein):

 

I think there is only one way to philosophy: to meet a problem, to see its beauty and fall in love with it; to get married to it, and to live with it happily, till death do ye part – unless you should meet another more fascinating problem, or unless indeed you should obtain a solution. But even if you do obtain a solution you may then discover to your delight, the existence of a whole family of enchanting though perhaps difficult problem children for whose welfare you may work, with a purpose to the end of your days. [Karl Popper, Realism and the Aim of Science]

Como eu já disse em outro lugar, a Filosofia não é concebível sem a compreensão de que ela lida com problemas, seja definindo, explicitando, solucionando ou, mesmo, dissolvendo. É só a partir dessa compreensão que se penetra realmente no cerne da sua atividade e, ao mesmo tempo, abandona-se a ideia de que a história da Filosofia seja uma mera troca de opiniões mais ou menos arbitrárias que se anulam entre si; ou seja, uma conversa de lunáticos que já dura 2500 anos. Mas o excerto de Popper ainda tem uma outras características que julgo igualmente fundamentais: o reconhecimento de certa beleza nesses problemas e a decorrente paixão por eles. E não uma paixão vã, mas um casamento feliz até que a morte, a solução ou um problema ainda mais fascinante os separe. Em verdade, penso que nunca se separa dos problemas que um dia nos foram fascinantes. No máximo eles ganham o status de companheiros mais velhos, com quem partilhamos aquela intimidade silenciosa. Assim, a relação com a Filosofia e seus problemas tem um tanto da iluminadora distinção feita por Roger Scruton, entre a promessa – que se cumpre no tempo e, uma vez efetivada, acabe-se – e o voto. Este é, por sua própria natureza, um compromisso aberto e que se assume exatamente assim porque infinito. Não se completa nunca e estende-se, como diz Popper, até o fim dos nossos dias.

 

 

 

G. Ferreira

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  • Parabéns! É um post curto mas feliz em suas colocações.

    Percebi que, tanto o post sobre o senso comum quanto este, há uma contribuição de Mário Porta por meio do seu livro "A filosofia a partir do seus problemas". Grande livro por sinal.

    No entanto, em uma coisa gostaria de mais esclarecimento. Mário fala em seu livro, sem aprofundar-se, sobre um "dissolver o problema", algo que você também citou. O que seria essa dissolução do problema? Como se daria?

    Agradeço a ajuda!
    Paz e Bem!

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