“A obra do amor que consiste em recordar uma pessoa falecida é uma obra do amor mais desinteressado.
Se quisermos garantir que o amor é completamente desinteressado, podemos então afastar toda possibilidade de retribuição. Mas é isto justamente o que está excluído na relação com uma pessoa falecida. Se então o amor permanece, é que ele é verdadeiramente desprendido.
A obra de amor que consiste em recordar uma pessoa falecida é uma obra do amor mais livre que há.
Para por à prova corretamente se este amor é completamente livre, podemos afastar tudo o que poderia de alguma forma coagir alguém a manifestar o seu amor. Mas isso está de fato excluído na relação com uma pessoa falecida. Se então o amor permanece mesmo assim, trata-se da forma mais livre de amor.
Se então tu queres examinar se amas livremente, trata de prestar atenção à maneira como tu ao longo do tempo te relacionas com um falecido.
Para examinar corretamente se o amor que há em alguém é fiel, podemos, é claro, afastar tudo aquilo com que o objeto do amor poderia, de alguma maneira, ajudá-lo a ser fiel. Mas tudo isso, justamente, está afastado na relação com a pessoa falecida, que não é realmente nenhum objeto. Se o amor ainda permanece, então ele é o mais fiel de todos.
A obra de amor que consiste em recordar um falecido é, pois, uma obra do amor mais desinteressado, mais livre e mais fiel. Vai então e exerce-a; recorda o falecido e aprende justamente assim a amar as pessoas vivas do modo desinteressado, livre, fiel.”
KIERKEGAARD, S. “A obra do amor que consiste em recordar uma pessoa falecida” In: As obras do amor.
No 30º dia de Rafael Dorneles.